
Oito patas querem manter duas serras em harmonia (uma delas elétrica)
CRÓNICA
Um restaurante fechou e mergulhou esta zona de Semide, em Miranda do Corvo, numa paz apenas quebrada pelos curiosos que ali passam. Mas eles não duram muito tempo ali porque estão em prontidão dois alarmes que detetam os movimentos em redor da Casa Branca.
GONÇALO COSTA MARTINS | Texto e fotos | 21 de fevereiro de 2024, 20H24
O silêncio instalado na serra é interrompido por outra, por uma serra elétrica. De serra para serra, elas entendem-se, mas tudo o que fuja ao vento, ao som do rio, aos pássaros e aos carros da Estrada da Beira que não param causam estranheza. Quem ali permanece algum tempo gera desconfiança, mas é difícil resistir à tentação.
Estão reunidos os ingredientes para os curiosos: um amplo espaço onde o carro pode ser estacionado, um restaurante fechado, uma varanda para o rio Ceira e uma zona montanhosa pintada de verde. A tranquilidade dá lugar ao inusitado quando encontra-se um espaço de várias piscinas vazias (pelo menos é o que parece). Mas à medida que a curiosidade puxa os passantes para perto, dois alarmes ligam-se.
Eletrónico? Não. Eles ladram e ganham intensidade a cada segundo. Tentam perceber quem anda ali - eu sou o alvo. Avistado, inicia-se uma corrida de um contra dois e a minha forma física é testada, má por sinal. Ainda assim, os cães não me apanharam e o susto era desnecessário: há um portão metálico que impediria o nosso encontro.
Pois bem, piscinas e restaurante vistos. Uma breve pesquisa no Google mostra que este já foi local de festa, de grandes convívios. As piscinas estavam cheios, existiam chapéus de sol, árvores vistosas e espreguiçadeiras. Os toldos verdes e amarelos dão cor à entrada do restaurante, a alma de um "espaço bonito e tranquilo", diz um blogger. Assim eram as "Varandas do Ceira".
Sigo caminho? Não. Uns metros à frente nova paragem para ver o recorte das montanhas, a serra que acolhe o rio Ceira, acompanhado pela EN17. Começo a ouvir uma serra elétrica e percebo que vem da Casa Branca (portuguesa) próxima do rio. Ela está a ser polida por um homem, com uma rapariga, quiçá a filha, ali presente ali. Não sei se deram pela minha inocente presença, de máquina fotográfica na mão, mas as oito patas repararam. Um de pelo castanho, outro preto, os dois juntos tentam encontrar novamente o caminho até mim e têm sucesso. Só que desta vez consegui chegar tranquilamente ao carro. Não julgo, estão a fazer o seu trabalho: proteger as duas serras.
Semide, Miranda do Corvo. 2o de fevereiro de 2024